sexta-feira, 25 de maio de 2012

Mídia e a discriminação autorizada pelo Estado

Preconceito no 'Brasil urgente' - A discriminação autorizada pelo Estado

Jornal do Brasil - 03/05/2012

Jorge Lourenço*

Desde a última segunda-feira (21/05), usuários de redes sociais de TV atacaram ferozmente a repórter Mirella Cunha, responsável pela deplorável entrevista de um acusado de estupro. O motivo da revolta é justo. Em pouco mais de três minutos, a jornalista do Brasil Urgente traz o jovem negro às lágrimas ao acusá-lo inúmeras vezes de estupro e caçoar da sua ignorância a respeito do exame de corpo de delito.

Apesar de ter sido republicada por vários comentaristas na internet, a revolta nasceu no blog de Renato Rovai, editor da revista Fórum. Desde que o jornalista apontou os erros grosseiros da atuação de Mirella, tanto a repórter quanto a Rede Bandeirantes foram alvo de críticas. A emissora, inclusive, se comprometeu a tomar “medidas disciplinares necessárias” com os profissionais envolvidos.

O problema é que um detalhe fundamental tem escapado aos críticos: o desleixo do poder público. Todo aquele show de preconceito e ignorância protagonizado por Mirella Cunha aconteceu dentro de uma delegacia. Dentro de uma repartição pública erguida com o meu e com o seu dinheiro. Um local criado para proteger o meu e o seu direito, não para servir de palco para um bizarro espetáculo de uma corporação privada.

O caso de “Paulo”, o jovem acusado de estupro, foi o mais emblemático. No entanto, vale lembrar que o Brasil Urgente oferece abordagens deste gênero diariamente em todo o país. Uma rápida busca no YouTube revela uma série de réus que se tornaram atrações de circo graças às entrevistas da Rede Bandeirantes. Algumas mostram sérios indícios de problemas neurológicos, o que não impediu a emissora de divulgá-los amplamente. Muito pelo contrário. Fomentado pela popularidade dos freak shows, estes profissionais procuram justamente isso: humilhação pública, humor rasteiro, desrespeito aos cidadãos, atrações escatológicas oriundas de tragédias pessoais.

E tudo isso, relembrando, dentro de uma repartição pública. Esse detalhe, que ainda não foi alvo de críticas, é o que dá mais requintes de crueldade à entrevista de Mirella Cunha: tudo foi chancelado pelo poder público. Em última instância, esse preconceito cruel foi incorporado e referendado pelo próprio Estado. Tudo foi assistido de perto por agentes públicos, que nada fizeram para proteger a integridade de um réu que estava sob a tutela do Estado.

Dificilmente, alguma providência concreta será tomada quanto à atuação do programa na abordagem de acusados em delegacias. Sob o falso pretexto de que a atividade policial é de interesse público e a imprensa não pode deixar de acompanhá-la, é bem provável que Paulos e Mirellas se encontrem mais algumas vezes pelo país.

Mas fica a pergunta: onde estava o Brasil Urgente quando Thor de Oliveira Fuhrken Batista prestou depoimento? Nada contra o primogênito de Eike Batista, cujo caso merece atenção e ainda está longe de chegar ao fim. A diferença é que Thor ainda vai ser julgado. Já “Paulo”, pelo que tudo indica, foi condenado desde que veio ao mundo.


*Jorge Lourenço, jornalista, é quem assina a coluna Informe JB.

CARTA ABERTA DE JORNALISTAS sobre "O preconceito na reportagem do Brasil Urgente Bahia" - Enviado por luisnassif, qua, 23/05/2012 - 11:24

Escola de família, uma proposta de política pública

Escola de família, uma proposta de política pública (1)

Jornal do Brasil - 22 de maio 2012-05-25

Siro Darlan*

Finalmente, uma boa noticia. A Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro aprovou por unanimidade um projeto de lei do vereador Carlos Eduardo** para implantar um programa de orientação e apoio às famílias desestruturadas e necessitadas de acompanhamento para melhor gerir sua função no exercício do poder familiar.

A proposta agora foi enviada para sanção do prefeito, que assim terá a oportunidade de tratar essas famílias da forma preconizada pelo artigo 129, IV, do Estatuto da Criança e do Adolescente. O projeto consiste na oferta de cursos ou programas de orientação e apoio às famílias que são negligentes nos cuidados com os filhos, fazem uso de substâncias que causem dependência física ou psíquica, ou sejam autores de abusos ou maus-tratos contra crianças.

Com esse instrumento social, poderá a prefeitura dar uma resposta a esse grave problema social cobrando responsabilidade aos pais e ajudando-os a superar problemas de conhecimentos básicos nos cuidados familiares, tais como a busca de documentos necessários para o exercício pleno da cidadania, a busca de emprego, a matrícula dos filhos em escolas, e outras providências que muitas vezes não são feitas por falta de orientação e apoio.

A mudança no eixo das ações da prefeitura poderá proporcionar movimentos a favor das crianças, ao invés das ações repressivas contra as crianças. O tratamento das famílias através de uma rede de apoio psicossocial será de grande valia na mudança da filosofia de criminalização da pobreza, cumprindo o poder público o seu dever constitucional de ajudar no desenvolvimento das famílias. Sanciona, prefeito.

*Siro Darlan, desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, é membro da Associação Juízes para a Democracia. - sdarlan@tjrj.jus.br

** Dr. Carlos Eduardo (PSB) - O vereador é médico - dr.carloseduardo@camara.rj.gov.br

(1) Com todo respeito que devemos ao Dr. Siro Darlan, por sua atuação já histórica... É preciso que fiquemos atentos/as para que a "escola" de família não utilize conteúdos de "educação religiosa".  Caso isso venha a ocorrer, temos a convição de que a intolerância religiosa irá imperar.  E isso, o governo municipal e qualquer outro têm o dever de penalizar. (MLG)